Meninos e meninas da metade do século passado,
essas, especialmente, recebiam uma educação doméstica, em que pesava um forte
conteúdo de formação cristã.
Não raro, as garotas eram matriculadas em
escolas religiosas, onde aprendiam de tudo sobre a Santa Madre Igreja. Ali
exercitavam os mandamentos de Cristo, cultivavam os dons espirituais,
freqüentavam missas, rezavam ladainhas, sempre glorificando o Pai, autor de
todas as maravilhas encontradas na terra.
Ao se porem moças, as meninas de antigamente
costumavam mandar mensagens às colegas, através de santinhos, escrevendo no
verso frases de efeito, como esta: “Quando vires a tarde triste e o céu
querendo chover, lembra-te que são meus olhos, que choram por não te ver”; ou
esta: “Tenha-me na lembrança, como eu te tenho no coração”. Nos dias atuais,
esses “oferecimentos” poderiam até ser vistos de uma forma “suspeita”, por
conta da maledicência. Entretanto, eles eram puros, inocentes, ingênuos sem
qualquer traço de pecado.
É interessante destacar que a qualidade desses
“santinhos “, denunciava o nível social de quem os usava para suas
dedicatórias. Por exemplo: no Colégio da Imaculada Conceição, frequentado pelas
classes alta e média-alta de Fortaleza, havia quem fizesse uso desse “brindes”,
trazidos da Europa, muitas vezes com inscrições em francês e/ou mesmo em latim. Enquanto
isso, nos estabelecimentos públicos, igual costume de se comunicar era
verificado, só que ao invés dos “santinhos” made
in France, eram utilizados os que serviam de propaganda da Pomada
Minâncora. O efeito, nos dois casos, não era diferente: comunicação feita,
pensamento exteriorizado e alegria recíproca entre “dar e receber”.
Um fato digno de registro era a preferência que
se dava aos “santinhos”, com a imagem de Maria, talvez pela identificação do
gênero. Era comum que eles trouxessem invocações à Santa Mãe de Jesus, sempre
pondo em realce a sua misericordiosa proteção. Essas singelas ofertas, se
trazidas da França, eram guardadas como verdadeiras relíquias. Tais
preciosidades atravessaram décadas, chegando ao século XXI intactas,
denunciando o refinamento de uma época em que a sociedade primava pelos bons
costumes, sem se ater ao mundanismo que hoje impera.
As famílias, note-se bem, já não educam seus
filhos dentro de uma linha cristã (há exceções, obviamente). As mães, da mesma
forma, já não seguem o exemplo de Maria, reservando mais tempo para si, em
detrimento da assistência aos filhos, carentes de amparo, principalmente nas
questões emocionais. Perde-se, pois, mais tempo com as coisas materiais, do que
com as relacionadas ao espírito (há mães, entretanto, que contrariam a regra
geral). O que de mais importante há, nesses “santinhos”, não é o seu valor
histórico, mas a denúncia que ele sugere na mudança de hábitos culturais.
A garotada deixou de usá-los, como veículos de
comunicação, até se chegar ao ponto de a “galera” do novo século ter adotado
novas formas de mensagens. Agora, tudo tem a ver com internet, msn, facebook,
blog, I-pad e por aí vai. Com isso, vão se perdendo os referenciais da
boa escrita, e o que é pior, ficam todos expostos nas redes sociais,
sinalizando perigos em grande parte dos relacionamentos.
Que tal dar um retorno às origens? Ainda é
tempo de experimentar a vida, sem maquiagem. Mesmo que se diga hoje, com
frequência, “Maria, passa na frente”, seria oportuno, também voltar à era dos
“santinhos”, deixando escrito, no seu verso, a dedicatória que qualquer pessoa
de fé faria, para uma pessoa amiga: “Que Maria te proteja. Seja feliz”!
Elsie Studart
Gurgel de Oliveira
Escritora e memorialista.
.
Nota: Com este
artigo, publicado, originalmente, em
O Povo, no Jornal do Leitor, de 27 de abril de 2012, a SMSL rende
homenagem póstuma a Elsie Studart, recentemente
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