Meraldo Zisman (*)
Na minha
formatura fiquei calado, enquanto os outros colegas juravam em voz alta. Em sua
maioria, cristãos: católicos quase todos e protestantes ainda minoritários, à
época; havia um judeu (eu) e mais quatro ou cinco colegas judias colando grau.
Não havia sido inventado o tal de culto Ecumênico, portanto houve missa
católica, culto evangélico e cerimônia judaica. Só não houve cerimônias dos
cultos africanos, pois não eram aceitas e eram até perseguidas. Também não
havia nenhum afrodescendente, segundo a atual classificação do IBGE. Os mais
escurinhos eram brancos. Não eram agora doutores? Aí saio do juramento e entro
em outra praia. Vamos deixar essa questão de ter mais ou menos melanina pra lá!
Juramento está mais para religião do que para discriminação.
Para mim
os que juraram, pecaram — perjuros. Perjurar é jurar com falsidade (eu, também
pequei, fiz de conta que jurei). Já faz tanto tempo que Deus e Belzebu até já esqueceram.
Mas veja meu leitor se não tenho razão. O Olimpo Greco Romano é um lugar de
muitos deuses e semideuses, tantos que misturo um com outro apesar de ter
estudado humanidades.
No juramento médico são avocados vários deles: Apolo é um
deus muito poderoso. Embora tenha tido inúmeros amores, foi infeliz nesse
terreno, mas teve vários filhos. Atualmente é patrono de cultos pagães ou de
religiões politeístas. Esculápio é o deus da Medicina e da cura. Teve duas
filhas: Hígia (deusa da saúde, limpeza e higiene) e Penácea (deusa da cura),
daí o nome de panaceia — remédio(s) que cura(m) todos os males.
Chega de cultura clássica. Voltemos às religiões. Cada um
com a sua. Advirto que não desejo converter ninguém. Mas creio ser mais
apropriado, para os dias de hoje e após tantos avanços médicos, uma mudança
desse juramento, que dizem datar do século IV antes de Cristo, pois Hipócrates
viveu entre os anos de 460-377
a.C.
“Ó Deus,
enchei meu espírito de amor pela arte e por todas as criaturas. Não consintas
que a sede de riqueza ou o desejo de glória influam no exercício da minha
profissão; fazei com que eu consiga ter sempre presentes a ciência e a
experiência. Grandes e sublimes são as investigações científicas quando seu
objetivo é conservar a saúde e a vida de todas as criaturas; fazei com que eu
seja moderado em tudo, mas insaciável em meu amor pela ciência” (o negrito
é do autor).
Assim
fica mais fácil clinicar. Não acham?
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco.
Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE)
e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES).
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