Um cardiologista dava plantão noturno em um
hospital de Fortaleza. O plantão estava muito movimentado devido ao acúmulo de
pacientes de maior gravidade, o que demandava cuidados permanentes da equipe de
plantão, com várias intercorrências sucessivas. Às 21 horas, faleceu o paciente
do leito 1 e às 23h, a paciente internada no leito 3; nos primeiros minutos, após
a meia-noite, o paciente do isolamento (leito 7) sucumbiu, e, meia hora depois,
o doente, hospitalizado no leito 5, veio a óbito, deixando sozinha, na UTI, uma
senhora que fora admitida no leito 2, logo no início do plantão, posto que os
leitos 4 e 6 ainda estavam desocupados.
A paciente sobrevivente, que a tudo
assistia, desde as manobras ressuscitatórias até o preparo e a remoção dos
corpos, não conseguia conciliar o sono. Por volta das três da madrugada, o
cardiologista nota que a paciente está encolhida, toda enrolada no lençol,
expondo apenas um pouco do rosto.
Ao aproximar-se dela, crendo que estava com
frio, percebe que ela pronuncia, repetidamente, uma jaculatória:
– “Oh! Maria, concebida sem pecado / rogai por
nós que recorremos a vós”.
A paciente ao vê-lo, tão pertinho,
inocentemente, indaga:
– É assim mesmo, doutor? Alguém escapa dessa
UTI, quando o senhor tá de plantão?
Naturalmente que, por conta disso, esse
médico, injustamente, carrega até hoje a fama de “pé-frio”.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Da Sobrames-CE e da ABRAMES
* Publicado In:
SOBRAMES – CEARÁ. Letras que curam. Fortaleza: Sobrames-CE/Expressão, 2013.
328p. p.223.
Nenhum comentário:
Postar um comentário