Por Ricardo
Alcântara (*)
Cito como lembro: o poema conta que, no primeiro dia, ele
entrou no meu jardim, roubou uma flor e eu não disse nada. Nos dias seguintes,
idem. Até o dia em que arrancou a última flor e, como eu não havia dito nada,
mais nada poderia dizer.
Dos versos lembrei ao refletir sobre o curso gradual com
que o PFG – Partido dos Ferreira Gomes – neutralizou, defenestrou e eliminou
seus aliados tradicionais para, unindo-se ao lulismo emergente, alcançar a
hegemonia política no estado.
Sem me alongar em episódios sabidos, lembro que,
governador, Lúcio Alcântara comprometeu indevidamente sua própria autoridade ao
tolerar que o deputado Ivo Gomes recolhesse assinaturas para instituir uma CPI
dos Terceirizados.
Ora, a CPI mirava denúncias de corrupção em um governo
que garantia à família do deputado quase todos os cargos públicos na sua região
de origem! Um governo que tolera isso se faz merecedor dos aliados que tem e
deles não deveria se queixar.
Em seguida, o outro tucano-mor da aliança, Tasso
Jereissati, esfarelou seu próprio partido quando negou apoio à reeleição do
então governador e abriu espaço para a candidatura adversária: o irmão mais
novo do seu amigo number one, Ciro Gomes.
Com um arco eleitoral que uniu do banqueiro Adauto
Bezerra ao trotskismo fake de Luizianne Lins sob as bênçãos do
popularíssimo presidente Lula, Cid Gomes tomou para si o governo do estado e,
mais recentemente, a prefeitura da capital.
Governo eleito, Tasso recebeu cedo o suficiente aviso:
pelo suicídio partidário, receberia a modesta compensação de uma secretaria de
Justiça – uma penca de problemas sem potencial nenhum de acumulação de força
eleitoral. Não entendeu.
Em Brasília, o senador batia duro no governo do
presidente, aliado do governador, e, sem recibo à sutileza dos recados, ele,
que já fora o leão da selva, como um gatinho de salão dissimulava o rancor à
espera de apoio para um novo mandato.
Veio a eleição e, imposição dos fatos, os Ferreira Gomes
legaram a quem por eles tudo havia perdido a precária hospitalidade do relento
porque o preço cobrado pelo apoio de Lula era aquele mesmo: pijama branco de
listas azuis para o tucano.
Ontem, vi Tasso Jereissati na televisão reclamando que
Cid Gomes está “brincando de ser governador”. Pois pelo nó de marinheiro que
deles recebera, Tasso deveria levar um pouco mais a sério a competência
política dos seus alegados traidores.
Antes, fosse tudo “brincadeira”! Como um predador
dissimulado, o Partido dos Ferreira Gomes segue eliminando aliados – Tasso e
Lúcio, Luizianne Lins, Sérgio Novaes... quem será o próximo? – e devorando
alguns embriões de resistência.
O golpe fatal está em curso: empurrar Eunício Oliveira
para o beiral da derrota, atraindo com uma senatória para José Guimarães as
tendências majoritárias do PT cearense, onde já pontifica um naipe de aplicados
guaxebas do mando oligárquico.
Pois eleito senador, Guimarães que se cuide: será o
próximo! Ali, a regra é clara: nenhum aliado será poupado a partir do momento
em que tenha alcançado a melhor posição enquanto coadjuvante daquele projeto de
poder. A forca é o limite.
(*) Jornalista e
escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre
é cão
sem dono. Se gostou, passe adiante.
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