Por Tales de Sá
Cavalcante (*)
Uma brasileira, em Lisboa, perguntou a um português: "Que horas
escurece aqui?" "Não escurece, acendemos as luzes", respondeu
o lusitano a usar a língua ao pé da
letra, o que, por vezes, leva-nos ao riso.
O português prefere a linguagem formal; e o brasileiro, a coloquial.
Expressões errôneas entram em moda e são repetidas, como as fake news. Pedagogos utilizam uma delas,
que, pelo constante emprego, já está no dicionário: se um aluno estuda no turno
da manhã, algo realizado à tarde será no "contraturno", mas a tarde
nunca foi contra a manhã.
Muito se menciona: "Concordo em gênero, número e grau." Porém,
o saudoso Genuino Sales dizia concordar em gênero e número, visto que essas concordâncias
são obrigatórias, enquanto a de grau é optativa.
Se alguém nada possui, deve falar "eu não tenho nada" ou
"eu tenho nada" (em inglês, I have nothing)?
Os gramáticos, como Said Ali, em 1921, e
seguidores, acham que duas negativas formam uma negação reforçada. Já os
ligados à lógica aristotélica, com raízes filosóficas ou matemáticas, veem na
dupla negativa uma afirmativa, já que se "não tenho nada" é porque
detenho algo.
Este articulista elege a assertiva "eu tenho nada", a
seguir Bertrand Russell e Alfred Whitehead no princípio da dupla
negação: "Uma proposição é equivalente à falsidade de sua negação."
É a divergência que nos dá energia para a vida. Se duas pessoas tiverem
uma conversa discordante, a tese vencedora não será a de uma ou a de outra, senão a resultante do diálogo
entre ambas.
No país do futebol, se uma equipe perde no campo e ganha na justiça
desportiva, diz-se que ganhou no tapetão, mas perdeu nas quatro linhas, uma vez que o campo
é delimitado por quatro linhas.
Resolveu-se agora afirmar que obedecer à nossa Carta Magna é estar dentro
das quatro linhas da Constituição, a admitir sua limitação por quatro segmentos de reta, o que seria, no
mínimo, uma metáfora precária, de acordo com Merval Pereira, membro da Academia
Brasileira de Letras.
Talvez, se seguirmos quem nos ensinou o idioma, tenhamos mais luzes
acesas e nossa comunicação receba mais raios de sabedoria.
(*) Reitor do FB
UNI e Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias Brito. Membro da Academia
Cearense de Letras.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/8/21. Opinião, p.18.
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