Por Ana Miranda (*)
Ah, se tivéssemos ouvido o senador Pompeu o Ceará seria hoje um estado
repleto de bosques, matas entremeando plantios, florestas frondosas. Nosso
clima seria mais fresco e o ar mais puro, teríamos mais chuvas, húmus, nuvens,
alimentos, mais bem-estar e beleza, madeiras, medicinas, mais vida animal e
vegetal, bancos genéticos, rios mais caudalosos, fertilidade da terra...
Teríamos, se seguíssemos as campanhas de Pompeu de Sousa, açudes por todo
lado, espelhos de água refrescante, reservas com água recolhida das chuvas,
água para a agricultura, para o consumo humano, vegetal e animal. Ele nos
dizia, já no século 19, que devemos progredir sem destruir a natureza. A
ausência das matas, pregava Pompeu, traz secura à atmosfera, esterilidade aos
campos, desterro e destruição a um país. E seus alertas se desdobravam em
textos convictos, alarmantes - e belos:
"Inútil Cassandra! Debalde havemos demonstrado com os princípios da
ciência, com a autoridade dos sábios, com a experiência d'outros países, e até
com a nossa própria, que o pernicioso sistema de roteamento de matas, o
incêndio dos campos no sertão, apressarão o termo de completa ruína de nossa
terra, e deixarão a nossos vindouros solidões, e ruínas, e uma maldição eterna
à nossa memória".
Ele acreditava, como os iluministas de seu tempo, como Humboldt, como
Goethe, como Rousseau, no poder dos seres humanos de interferir na natureza.
Creio que para o bem e para o mal. Grupos humanos tornam florestas em lugares
desérticos; outros tornam desertos em locais férteis, frescos e agradáveis. Ele
tentou educar agricultores, criadores, governantes, fez campanhas incansáveis a
pregar suas ideias ecológicas - foi o primeiro por aqui a usar o termo
"ecologia". Pregou a arboricultura e o manejo correto de plantas; a
preservação de florestas e mananciais e o reflorestamento do que já fora
devastado. Transmitia seu pensamento por meio de artigos de jornal, livros,
relatórios, discursos no Senado. Absorto na contemplação da natureza, sempre em
conexão com os seres humanos, usava muito de seu tempo medindo e anotando.
Desenhava quadros com dados sobre índices de chuvas, de temperatura, épocas de
estio, ao longo dos anos, fazia quadros comparativos. Usava o que a ciência
podia alcançar, lia os naturalistas, os científicos, os diários de viagens. E
foi bem claro, em tudo o que pensava. E poético.
"Antigamente", fala das serras cearenses, "à tarde, pela
manhã até alto sol, e principalmente à noite, a névoa descia dos píncaros, ou
levantava-se das matas, e brejos, e estendia-se sobre a planície e habitações,
envolvendo tudo debaixo de um imenso tocado de vapor úmido. A temperatura em
todo tempo baixa, e desde as 4 horas da tarde o frio começava a incomodar aos
forasteiros: hoje apenas sente-se à noite um ar mais fresco".
Mas, infelizmente, no Ceará não seguimos as ideias do Pompeu, não
plantamos matas e, a cada dia, desmatamos. Nascido em 1818, na cidade de Santa
Quitéria, Tomás Pompeu de Sousa Brasil, trisavô da maravilhosa escritora Angela
Gutiérrez, foi uma dessas explosões de inteligência cearense.
(*) Escritora.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 21/08/21. Vida & Arte, p.2.
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