quinta-feira, 17 de setembro de 2020

ELEIÇÃO, SINTOMA E JABUTICABA

Meraldo Zisman (*)

Médico-Psicoterapeuta

A pergunta é mais importante do que a mais inteligente das respostas: — será que a eleição resolverá os problemas nacionais?

Como médico ou simples cidadão, sem distorção profissional, esclareço ser o termo sintoma referente às manifestações (dor, febre, náuseas, vômitos, diarreia, etc.) que, indicadas por determinadas doenças, auxiliam no estabelecimento de um diagnóstico, pois sem uma análise correta, não poderá ser definida a terapêutica adequada: baixar a febre com o antitérmico pode aliviar o mal-estar da pessoa, mas, sem tratar a causa, a febre pode voltar, às vezes com maior intensidade…

A Operação Lava Jato e assemelhadas são baseadas na Lei da Ficha Limpa que prevê a delação premiada e na Lei da Transparência. A despeito da sua importância no saneamento nacional da classe político-empresarial ou servindo de exemplo para as demais camadas sociais, tais operações não são instrumentos adequados para que se atinja mudanças estruturais ou reformas governamentais.

Já que os partidos políticos passaram a ser agrupamentos eleitorais e propriedade de alguns poucos poderosos, sejam do mundo político ou econômico, os candidatos a cargos eletivos tornaram-se reféns dos arranjos partidários. Ademais, qualquer que seja o resultado da votação, o presidenciável & Cia escolhidos, sejam eles de direita, de esquerda ou de centro passam também a serem reféns do Congresso, das maiores bancadas e do toma-lá-dá-cá.

É essa a grave enfermidade do Presidencialismo Imperial (de Coalizão para permanecer na moda da expressão do politicamente correto). Fica-se preso aos conchavos e aos eventos político-administrativos. Em consequência, para permanecer no cargo o jeito é engrossar o caldo de cultura propício ao crescimento das bactérias causadoras da nossa corrupção epidêmica.

Resumo da ópera:

Não creio que uma eleição, por si só, trará resultados para o bem do país, se não houver mudanças radicais na estrutura atual dos três poderes e desconheço, por parte dos candidatos atuais, alguma indicação de por onde vão começar. Compreendo que os problemas são complexos e crônicos, mas quem nem sabe por onde começar desconhece o caminho certo.

Juízes, Procuradores e Magistrados não foram togados para gestarem reformas relativas ou pertinentes ao Estado, à Nação, ao governo eleito ou até aos não eleitos.  Razão tinha Millôr Fernandes (1923-2012) quando afirmava: “Em política nada se perde e nada se transforma — tudo se corrompe”. E tem mais, os nossos presidentes têm data de posse mas o tempo de mandato é sempre uma incógnita.

Arremato dizendo que Lula está preso. É um ex-presidente que permanece aspirando mais pompa e tropeça nas circunstâncias. Nesta eleição que se aproxima dois candidatos estão com problemas. O esquerdista está aprisionado e o da direita encontra-se na UTI. Os demais parecem perdidos no nevoeiro, sem bússola. Será que a nossa eleição não é mais uma jabuticaba? Relembro.

É comum relacionar lances inusitados da política nacional à jabuticaba, fruta silvestre que dizem só existir no Brasil.

Será verdade?

Nem isso, segundo afirmam os botânicos. Apesar de ter origem brasileira, ela não existe só por aqui. A jabuticabeira, que pertence à família Myrtaceae, nasce com facilidade em regiões próximas aos trópicos. Existem exemplares em vários países da América Latina, como México e Argentina. No Brasil, ela floresce de Norte a Sul, mas tem maior ocorrência na região sudeste.

Portanto, nem a jabuticaba nem a corrupção são (nem isso) exclusividade nossa...

(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES) e da Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).

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