Meraldo
Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
… É possível que a maioria dos
americanos tenha pelo menos uma vaga ideia sobre a queima de livros imposta
pelos nazistas; imaginem no Brasil, com o nosso analfabetismo funcional e
alguns de nós dispondo da tecnologia que se espalha pelo Mundo, quando os
avanços tecnológicos precedem a Cultura…
Todos devem ter
muito cuidado com as polarizações (divisão em dois campos antagônicos), tanto
os que combatem os preconceitos de toda a ordem, como os que se dizem
indiferentes; seja na saúde, na política, até no amor e agora com relação à
morte por asfixia de pessoa preta. Por outro lado: “No inferno os lugares mais quentes são reservados
àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise.”
― Dante Alighieri.
A revista norte-americana Newsweek publicou
em 09/08/2020 artigo noticiando: “Finalmente, depois de 60 dias de
protestos Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), passada
a meia-noite na cidade de Portland-Oregon, queimaram uma Bíblia e uma bandeira
norte-americana”.
Os queimadores do pavilhão dos Estados
Unidos e da Bíblia agitavam faixas do movimento do “Black Lives Matter” o que
resultou num vídeo que se tornou viral, com mais de 1,8 milhão de visualizações
e milhares de retuítes, segundo afirma aquela mesma fonte. É possível que a
maioria dos americanos tenha pelo menos uma vaga ideia sobre a queima de livros
imposta pelos nazistas; imaginem no Brasil, com o nosso analfabetismo funcional
e alguns de nós dispondo da tecnologia que se espalha pelo Mundo, quando os
avanços tecnológicos precedem a Cultura.
Como judeu
brasileiro eu me recordo das Noites de Cristais (Kristallnacht). Foi um ‘pogrom’ contra os judeus confabulado pela
Alemanha Nazista acontecido nas noites de 9 e 10 de novembro de 1938, levado
a cabo pelas forças paramilitares de Hitler e por civis alemães. As
autoridades alemãs observaram o acontecimento sem, no entanto, intervir…
Enquanto isso, a organização dos direitos
dos afrodescendentes norte-americanos afirma que os ataques à vida de negros e
palestinos deveriam ser considerados conjuntamente e insistem em misturar de
modo preconceituoso a violência policial com a situação no Oriente Médio, que
aparece subliminarmente como tendo sido causada pela existência de Israel.
Quando invoco a associação livre da
psicanálise, lembro que ela oferece inúmeras vantagens: expõe o analisando à
menor dose possível de compulsão, jamais permitindo que perca contato com a
situação corrente real.
Ninguém será livre
até que todos nós sejamos livres, sobretudo ao se tratar de preconceitos de
todos as modalidades. Lembro que as cadelas, tanto do “fascismo” quanto do
“comunismo” estão sempre no cio e concluo, como dizia o Bertolt Brecht (1898-1956), dramaturgo alemão e grande
pensador que aduzia que sua obra fugia dos interesses da elite dominante, pois
visava esclarecer as questões sociais da época. Dizia ele, entre outras
denúncias feitas na sua maneira artística de se exprimir:
“Primeiro levaram os negros, mas
não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida levaram alguns
operários. Mas não me importei com isso; eu também não era operário. Depois
prenderam os miseráveis. Mas não me importei com isso, porque eu não sou
miserável. Depois agarraram uns desempregados. Mas, como tenho meu emprego,
também não me importei. Agora estão me levando. Mas já é tarde. Como eu não me
importei com ninguém, ninguém se importa comigo. Ajudar o próximo pode ser uma
ótima maneira de se sentir bem consigo mesmo por isso escrevo essas minhas
opiniões e associações livres na minha gaiola social. Correndo o risco de ser
um pássaro a procura de uma gaiola”.
(Bertolt
Brecht)
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES) e da Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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