Por Luiz
Gonzaga Fonseca Mota (*)
Quem tem menos de 60 anos de idade,
provavelmente não se lembra do Abrigo Central. Era um “mercado aberto”, ao lado
da Praça do Ferreira onde se reuniam políticos, torcedores, desempregados,
apontadores de jogo do bicho, boêmios, estudantes, motoristas, empresários,
enfim, era o local mais democrático de Fortaleza. Símbolo da liberdade
cearense, no velho Abrigo compras eram feitas, papos eram batidos,
merendava-se, sapatos eram engraxados, tomava-se cafezinho. Lembro-me de uma
cena que jamais esquecerei: tinha 12 para 13 anos de idade, estava com alguns
colegas merendando em uma lanchonete do Abrigo quando de repente surge o então
governador Raul Barbosa acompanhado de outros políticos, para tomar café junto do
povo. A emoção de todos nós foi grande. Quanta simplicidade da autoridade maior
do Estado. Assim era o Abrigo Central! Existiam três pessoas famosas no velho
Abrigo: “Pedão”, da bananada, torcedor do Ceará, “Zé Limeira”, chefe dos
engraxates e da torcida do Ferroviário, e “Bodinho”, da banca de jornal,
apaixonado pelo Fortaleza. Assim, desde menino já conhecia o Zé Limeira, pois
era, como ainda sou, torcedor do Ferroviário. Nossa aproximação maior aconteceu
muito tempo depois, em 1982, já não mais existia o Abrigo, era eu candidato ao
Governo do Ceará. Daí para frente, o poeta e amigo Zé Limeira incorporou-se ao
meu dia a dia, participando ativamente da minha vida pública. Lamentavelmente,
em 7 de abril de 2004, faleceu aos 79 anos o querido Zé, quixadaense de escol.
O poeta, como era chamado, fez dois livros contando suas “lambanças”, estórias
e lembranças. O mais curioso é que ele não sabia ler nem escrever. Não teve
oportunidade de cursar uma escola, todavia era formado pela “Faculdade da Vida”. Seu primeiro livro foi
prefaciado pela inesquecível Raquel de Queiroz e tive a honra de redigir o
prefácio do segundo. Como já salientei, Zé era um homem de poucas letras,
aliás, de nenhuma letra, mas dotado de conhecimentos fundamentais. Devo muito a
ele, pelo que por mim fez na política, orientando-me e colaborando para que eu
errasse menos e acertasse mais. Sempre dizia que Zé era o meu “assessor para assuntos
aleatórios”. Foi o
único marqueteiro que tive em minha vida. Homem de bom coração e dotado de um
sentimento de amizade fora do comum.
(*) Economista. Professor aposentado da UFC.
Ex-governador do Ceará.
Fonte: Diário do Nordeste, 8/03/2022. Ideias.
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