Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Sismógrafo é um instrumento que detecta, amplia e registra as
vibrações da Terra, sejam elas provocadas por processos naturais ou pelo Homem.
Meu pai e eu criamos o vocábulo “sismógrafo judaico”, para
explicar a judaica premonição dos ‘pogroms’, que atua como se fosse uma espécie
de sismógrafo interno. Os judeus ouviam, sentiam, cheiravam que o ar que
respiravam tornava-se diferente, e até o relinchar dos cavalos dos cossacos
ficava mais alto e nervoso.
Confesso que não simpatizo com a comparação do que ocorre no
Brasil com o que está acontecendo nos Estados Unidos, por saber que escravidão
branda não existe – como almejava o nosso grande sociólogo Gilberto Freyre.
Dito isso, seja no Brasil ou na América do Norte, a escravidão, servidão,
cativeiro, é sujeição desumana que atinge todas as sociedades em qualquer lugar
do Mundo. É a forma aguda do preconceito.
Temos muito o que crescer intelectualmente, não basta criar
cotas ou empregar repórteres de todas as tonalidades da pele humana mais
escurinhas, ou menos, ou mais preta, nos canais de TV.
É preciso modificar a mentalidade, psicoeconômica (saúde
emocional e econômica), brasileira; é preciso modificar a mentalidade frívola
de nossas elites.
No Brasil, continuo afirmando, enquanto não resgatarem os
negros, mestiços, mulatos e índios da escravidão não sairemos do
subdesenvolvimento.
Não sei o que sinto em relação a quem diz não haver preconceito
racial em nosso meio, atualmente. Peço piedade, pois são idiotas ou alienados.
Ao tentarmos esconder essa verdade de nós, é bom lembrar que o que se recalca é
caminho certo para a angústia nacional e a exclusão voluntária no campo da
consciência de certas ideias, sentimentos e desejos que o indivíduo não quer
admitir, mas que continuam a fazer parte de nossa vida psíquica, podendo dar
origem a graves distúrbios. Recalcamentos emocionais são perigosos para nossa
saúde dita mental. Denotam um mecanismo intelectual de defesa contra ideias que
sejam incompatíveis com o eu.
Daí dizer que o escravo pode se alforriar e ficar livre,
enquanto o senhor — o dono do escrevo— jamais se libertará da escravidão que
acalentou.
“A escrava pegou a filhinha
nascida/ Nas costas. E se atirou no “rio” Paraíba, para que a criança não fosse
judiada”, confira na poesia SENHORA (Pau-Brasil de
Oswald de Andrade 1890 – 1954).
Aos que argumentam que o racismo era comum na época, respondo
que comum não significa hegemônico, mas devemos todos lutar contra o
preconceito, seja sob qual forma se apresente no decorrer dos Tempos.
Será que herdei um sismógrafo, por ser de origem judaica?
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES) e da Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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