Por José Nelson Bessa Maia (*)
A recente desaceleração
econômica na China, fruto da reorientação de seu modelo de crescimento para
o mercado interno, do protecionismo de outros grandes países e de fatores
geopolíticos devia ser vista como um processo temporário e reversível no médio
prazo. No entanto, analistas de bancos e da grande mídia financeira
internacional aproveitam, com base na análise superficial do sobe e desce de
indicadores conjunturais, para prognosticar uma tendência duradoura de
estagnação do país asiático e de suposta futura crise econômica e política.
Nesse contexto e
diante do clamor de antiglobalização e regionalização das cadeias globais de
valor, a China, ao contrário do que é apregoado, persiste na sua estratégia de
promoção da abertura ao exterior por meio de uma série de ações concretas, como
a melhoria no clima de negócios, a realização de diversas feiras e exposições
comerciais internacionais, a implementação de acordos de parceria econômica e
liberalização do comércio com diversos países e regiões e facilitação de
investimentos. Tudo isso contribuindo para reforçar suas relações econômicas
externas e mitigar as tendências de enfraquecimento do livre comércio e do
movimento global de capitais.
Com efeito, a
grande maioria das empresas de capital estrangeiro que operam na China
se diz satisfeita com o ambiente de negócios favorável do país e confiante no
mercado chinês, de acordo com uma pesquisa divulgada pelo Conselho Chinês para
a Promoção do Comércio Internacional (CCPIT, em inglês) durante o segundo
trimestre de 2023. A pesquisa sobre ambiente de negócios no país considerou
itens como acesso ao mercado, pagamento de impostos, solução de controvérsias e
a situação de concorrência de mercado na China.
Assim, quase 90%
das empresas financiadas por estrangeiros que foram pesquisadas se declaram
satisfeitas com o ambiente de negócios chinês. As empresas estrangeiras também
parecem otimistas sobre sua atuação na China, com mais de 80% dos entrevistados
com expectativa positiva de que o retorno de seus investimentos permaneça
estável ou aumente em 2023.
No tocante a
feiras e exposições comerciais, a China realiza de 23-27 de outubro de 2023 a
segunda fase da Feira de Importação e Exportação da China, realizada em
Guangzhou (Cantão), considerada a maior feira comercial de exposições do
planeta. Trata-se de um evento de comércio exterior abrangente, com o maior
número de potenciais compradores, a mais completa variedade de produtos,
serviços e tecnologias e o maior volume de negócios do mundo.
Isso sem falar em
uma série de outras feiras setoriais já realizadas ao longo e até o fim do ano.
Embora a feira venha sendo realizado desde 1957, ela enfrentou desafios e
conseguiu superar todos eles, inclusive a pandemia de Covid-19. É um
evento que promove a conexão comercial entre o mundo e a China, e que, por sua
vez, evidencia as conquistas e os avanços que o país alcançou ao longo de
várias décadas.
No campo das
negociações comerciais a China envida esforços para colocar em operação a
Perceria Econômica Abrangente Regional (RCEP, na sigla em inglês), continua a
impulsionar a adesão ao Acordo Abrangente e Progressivo para a Parceria
Transpacífica (CPTPP) e ao Acordo de Parceria da Economia Digital (DEPA). Tudo
isso além de criar 21 Zonas de Livre Comércio Piloto, estabelecer o Porto de
Livre Comércio de Hainan e reduzir a lista negativa para investimento
estrangeiro direto (IED), com a ampliação da abertura ao capital externo de
setores de serviços como telecomunicações e saúde. Para completar esse esforço
de abertura econômica ao exterior, a China adota nova Lei de Investimento
Estrangeiro e um regulamento para otimizar o ambiente de negócios.
Desde 2013, a
China é o maior importador do mundo, com importações totalizando a marca de US$
3,45 trilhões em 2022, o que correspondeu a 13,8% das importações mundiais,
contra 8,35% para os EUA e 3,22% para o Japão. Somente o bloco da União
Europeia, com 27 países, é que supera a China como maior importador mundial,
com 22,93% do total.
No corrente ano,
segundo dados da OCDE, o valor das importações chinesas estaria se reduzindo em
relação aos trimestres anteriores, cerca de -0,7% no primeiro trimestre e -2,5%
no segundo. No entanto, essa tendência conjuntural é de ordem mais geral, uma
vez que muitos outros países que fazem parte do G20, como Alemanha, EUA e Índia,
apresentam também recuos nos últimos trimestres no valor de suas importações
por conta do cenário global de desaceleração econômica.
O fato que merece
destaque é que, sendo o maior importador mundial há 10 anos, a China tem
contribuído fortemente para o crescimento de seus parceiros comerciais pela via
da demanda chinesa por bens e matérias-primas junto aos demais países
com quem mantém relações de comércio. Na verdade, o ritmo das importações
chinesas funciona como um termômetro para os preços nos mercados de commodities
e um elemento de sustentação da renda e emprego nos setores exportadores de
inúmeros países, sejam aqueles avançados, emergentes ou em desenvolvimento, que
comercializam seus produtos com a China. Tudo isso sem mencionar a sinalização
que as compras chinesas no exterior dão para investidores nos mercados de
ativos pelo mundo afora.
Há, por fim,
razões para crer que a continuidade do processo de abertura da China para o
exterior, mesmo em um contexto mundial desafiador, atuará como uma alavanca
importante para enfrentar movimentos contrários à globalização e para a
manutenção das cadeias globais de valor e dos fluxos atuais de comércio
internacional, mitigando impactos adversos de medidas protecionistas tomadas
por outros países e evitando o isolacionismo econômico e o fechamento de
mercados. Essa postura chinesa é uma salutar aposta no futuro compartilhado do
mundo e uma contribuição responsável para o bem-estar geral e a paz mundial.
(*) Mestre em
Economia e doutor em Relações Internacionais pela UnB e rx-secretário de
Assuntos Internacionais do governo do Ceará. Pesquisador independente das relações China-Brasil, China-Países
Lusófonos e China-América Latina.
Fonte: O Povo, de 4/11/23. Opinião..
Nenhum comentário:
Postar um comentário