Por Nagib de Melo
Jorge Neto (*)
Temos um severo déficit
de cidadania. Tenho a impressão que a maioria dos brasileiros pensa que
direitos são favores que os políticos concedem ao povo. Talvez porque fui
criado em meio a pessoas pobres, no interior do Ceará, onde o clientelismo e o patrimonialismo ainda são
arraigados. Mas há outras pistas.
Aderimos
facilmente aos políticos e a suas ideias, defendemo-los apaixonadamente, como
se fossem nossos pais ou filhos. Frequentemente acreditamos na figura do
salvador da pátria. Precisamos de heróis.
A cidadania é quando tomamos o destino em nossas
próprias mãos. A subserviência é quando colocamos nosso destino nas mãos de
alguém, supostamente mais poderoso ou capaz. A democracia vale pouco sem capacidade
para a cidadania.
Isso sempre me intrigou. Por que agimos assim? Temos
dificuldade em cobrar responsabilidade dos políticos e administradores
públicos. Constrangemo-nos. Sentimos que somos mal educados ou grosseiros.
Gostamos de ser cordiais, como diria Buarque de Holanda. Talvez tenhamos medo. Os
políticos são poderosos, nós não. Talvez não nos julguemos parte da solução. O
problema é deles, não meu. Talvez não nos sintamos atingidos. Eles que
resolvam. Talvez não nos julguemos parte do problema. Sou um mero cidadão, o
que posso fazer?
Em um ano, somamos mais de 320 mil mortos pela covid. Em números absolutos, somos o
país com maior número de mortes em março. Em números ajustados pela faixa
etária, em apenas oito países, de 178 pesquisados, se morre mais por covid.
O risco de morrer por covid no Brasil é quase quatro
vezes maior que no resto do mundo. Vivemos um colapso hospitalar, na iminência
de um colapso funerário. Uma tragédia que mostra o fracasso das políticas de
enfretamento.
É preciso cobrar responsabilidades: moral, política
e jurídica. Quantas mortes poderiam ter sido evitadas se as vacinas tivessem
sido compradas a tempo, se houvesse coordenação nas políticas de isolamento
social e auxílio financeiro? Não estamos diante de uma escolha duvidosa.
No caso brasileiro, era possível prever o desastre.
A morte foi uma escolha consciente.
(*) Juiz federal e
professor da UniChristus.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 7/4/2021. Opinião. p.20.
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