Galinhas de onte
Meninos
em São Gerardo, fazíamos no quintal de casa um guisado que nem cachorro comia -
porque não sobrava. O prato principal: as sobras aproveitáveis da galinha
caipira que mamãe preparava pro almoço. Do que seria rebolado no mato, vísceras
descartadas, entendam-se as tripas da penosa. Que a gente "virava"
com palito de coqueiro, lavava bem lavadinhas e mergulhava no limão. Daqui
papôco estava ao nosso dispor o dicumê mais gabaritado do mundo. Na panelinha
de barro, fogo à lenha de tarisca de pau, uma boia de deixar o sujeito
"interado" até quando o dia amanhecesse; claro, com uma coisinha de
arroz pra fazer volume.
E
num desses domingos do nosso povo reunido no sítio Sossego, em Pacajus, pra
celebrar o aniversário de casamento de seu Zé e dona Tereza (meus pais)? Haja
galinha de capoeira como "refeição substancial". Umas quatro ou cinco
sangradas por motivo justíssimo. Faltando meia hora pra "comidoria"
ser servida (a cuia de farinha enorme já ouvindo a conversa no centro da mesa),
mamãe pergunta se eu gosto de pé de galinha. Falei que sim, desatento a
prováveis surpresas. Com pouco, lá se vem ela com meu prato já feito: feijão
bastante no fundo, cobertura de arroz e farinha e, espalhados na superfície,
oito pés de galinha escoteiros, com algum caldo pra disfarçar. E era pra ser
feliz!
O malandro, o mucunzá e a galinha
Conta-nos
o inoxidável amigo Giovani Oliveira que um malandro do Prado (na sua querida
Iguatu) tomou porre medonho de cana, tirando o gosto com mucunzá. Não se sabe
quantas lapadas entornou, mas uma panela de mucunzá foi-se embora nessa
brincadeira. Pela madrugada, o sujeito começou a passar mal. A mulher, muito
zelosa, levou-o ao posto de saúde. Lá chegando, estava de plantão o conhecido
Dr. Mendonça. A mulher, aflita, dirigiu-se ao médico:
-
Doutor, salve o pobre do meu marido pelo amor de Deus!
-
O que andou comendo?
-
Uma galinhazinha caipira...
Nesse
momento, o bebim vomita, exalando forte cheiro da pôde no recinto. O milho do
mucunzá vem em seguida. O médico se senta, colocando a mão no nariz. A consorte
do paciente melado, apavorada, pergunta:
-
O senhor não vai fazer nada?
-
Minha senhora, eu estou esperando que ele vomite o milho. Quando chegar na
galinha, não se preocupe, eu tomarei as devidas providências.
A festa da galinha
O
preclaro Stepherson Macedo Jereissati de Queiroz (carinhosamente
"Paraíba") costuma comemorar a mudança de calendário dos amigos em
sua residência. É a alegria maior dele. No caderninho dos "aniversariantes
do peito", cada dia tem um. Festa grande, todo amigo é merecedor de
honrosas celebrações. Mas, naquele sábado, por um lapso de memória, quiçá,
ninguém "interava ano". Ainda fez ligações, nada. Amigos é que não
podiam deixar de estar em sua casa para comemorar um parabéns. Chamou a mãe,
contou da infeliz notícia e propôs:
-
O jeito é comemorar o aniversário da nossa galinha (criada no quintal)! Não
pode é passar em branco dia assim tão convidativo!
-
Tá certo, Osmilton. Vou banhar ela e arrumar tudo!
Por
volta da meia noite (festança começou antes do meio dia), faltou tira-gosto. E
os convivas todos com fome. E aí? Nova proposta de Paraíba à mãezinha já
cansada.
-
É o jeito, mãe! Vamos sacrificar a aniversariante!...
Fonte: O POVO, de 15/10/2021. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos.
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