segunda-feira, 5 de setembro de 2022

ELEIÇÕES E RESPOSTA A NOVAS EMERGÊNCIAS SANITÁRIAS

Por Antônio Silva Lima Neto (*)

A atitude pessoal mais cruel do presidente da República ocorreu em março de 2021. Em uma de suas lives semanais, para ridicularizar o ex-ministro Henrique Mandetta, ele imitou jocosamente um paciente com falta de ar que arqueja, em meio a uma crise de insuficiência respiratória provocada pela Covid-19.

Em entrevista ao Jornal Nacional na última segunda, ao ser perguntado se lhe faltara compaixão, ele mentiu, negando o fato. Como se as imagens tivessem sido apagadas por uma máquina manuseada pelo Grande Irmão dos futuros distópicos.

Agora que se aproximam as eleições, ando a me perguntar o que teria ocorrido no cenário estadual se o Governador(a) tivesse seguido as recomendações de Bolsonaro. Teríamos recusado as medidas não farmacológicas (uso de máscara, isolamento social); investido no tratamento precoce ineficaz; subestimado a necessidade de estoques de oxigênio e da abertura preventiva de leitos; e desacreditado as vacinas. Viveríamos, provavelmente, o que houve em Manaus, no fatídico janeiro de 2021, durante intervenção calamitosa do Ministério da Saúde.

O risco de um novo governante se defrontar com uma emergência sanitária, como uma pandemia, não é desprezível. Esta exigirá medidas, eventualmente impopulares, mas baseadas na ciência, com o intuito máximo de salvar vidas. Essa possibilidade real é suficiente para que os eleitores rechacem políticos alinhados, mesmo de maneira velada, com o negacionismo.

Para algumas categorias a aceitação da perversidade é ainda mais grave. Médicos e outros profissionais que estavam na linha de frente do combate à pandemia, e têm na essência da sua prática a empatia com o sofrimento humano, parecem não ter se dado conta. Não esperem a história julgá-los e, sobretudo, evitem o desastre que sofreríamos caso o enfrentamento hipotético de uma nova pandemia fosse conduzido por pessoas incompetentes (tecnicamente e emocionalmente) para tal.

Depois da tragédia que vivemos, deveríamos ter no juramento de posse do Presidente e dos Governadores, uma cláusula de comprometimento inequívoco com a ciência, sempre que se deliberem sobre ações que impactem fortemente a saúde das coletividades.

(*) Médico epidemiologista, doutor em Saúde Coletiva, gerente da Célula de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza e professor do curso de Medicina da Unifor.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/08/2022. Opinião. p.15

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