Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)
Tive a honra e
privilégio de ser aluno do professor Richard Miller Bird. Coincidência (ou
não), há 25 anos concluía uma especialização na Comissão Econômica para América
Latina e o Caribe (Cepal), em Santiago do Chile, onde esta oportunidade me
propiciou absorver os ensinamentos do professor Bird na disciplina de federalismo
fiscal comparado. Bird tinha uma capacidade apurada de combinar, a teoria
econômica geral, com as realidades institucionais e a política, e um talento
para abordagens inovadoras - e por vezes não convencionais. Além disso, era um
sujeito simples, que fazia engradecer os alunos.
Uma das
relevantes pesquisas de Bird correlacionava os efeitos da tributação às
influências positivas na qualidade dos gastos e das políticas públicas. O professor
Bird enfatizava que os fatores institucionais levam a "um maior
enfoque na responsabilização e na capacidade". Assim, o grande ensinamento
era de que "os impostos só funcionam se você puder induzi-los e
controlá-los, em sua qualidade e retorno".
Nesse contexto,
os Governos do Estado do Ceará nessa trajetória de mais de 30 anos fizeram um
dever de casa sobre a influência de Richard Bird, ao conceberem um modelo de transferência
de receita, em que a cota-parte do ICMS, que é compartilhada com os
municípios, induziu a melhoria na qualidade e no retorno da educação pública do
ensino infantil, tornando o Estado do Ceará o maior, em índice de alfabetização
infantil, em 2023, atingindo um patamar de 85%, de acordo com levantamento
divulgado pelo Ministério da Educação (Mec).
O Indicador
Criança Alfabetizada de 2023 mede quantos estudantes do segundo ano do ensino
fundamental sabem ler e escrever devidamente, o que é considerado a idade ideal
para o aprendizado. O repasse municipal do ICMS no Ceará traz essa
virtude de estimular os municípios na busca destes indicadores de qualidade.
Afora o VAF (Valor Adicionado Fiscal), que mede a atividade econômica nos
municípios, os critérios próprios adotados pelo Estado estão baseados no alcance
de resultados em áreas consideradas estratégicas, como: Educação, Saúde e Meio
Ambiente.
Com a Emenda
Constitucional nº 108/2020, essa divisão relativa aos 25% foi alterada. Assim,
cada Estado define a aplicação. A partir da nova legislação, a divisão no Ceará
ficou: 1) 65% relacionado ao VAF; 2) 18% índice de qualidade educacional do
município; 3) 15% pelo índice municipal de qualidade da saúde (IQS); e 4) 2%
pelo índice municipal de qualidade do meio ambiente. Esta mudança abre um
espaço para que o Governo do Estado e seus municípios, de forma cooperada,
possam caminhar na direção da melhoria da qualidade de saúde da
população, como tem sido o caminho percorrido no ensino infantil, ou seja,
alinhamento com a execução da política estadual de saúde.
Os resultados do
IQS passam a decorrer da combinação da ação individual do próprio município e,
agora, do desempenho coletivo da macrorregional de saúde em que se encontra,
considerando a redução da mortalidade infantil (35%); AVC/ infarto (55%)
e acidentes de motos (10%). As macrorregiões são avaliadas de acordo o
desempenho nos mesmos indicadores e com a mesma forma de cálculo aplicada aos
municípios e o resultado regional é "rateado" entre os municípios que
a integram, conforme contribuição individual.
O professor Bird
desencarnou em 2021, mas este grande "pássaro" do federalismo fiscal
com certeza deve estar feliz em saber que o Ceará trilha caminhos na relação
positiva entre tributação e os resultados do gasto público.
(*) Mestre em
Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e
Planejamento do Eusébio-Ceará.
Fonte: O Povo, de 27/06/24. Opinião. p.19.
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