Por Pe. Eugênio
Pacelli SJ
(*)
A cultura pós-moderna vive um antagonismo: de um lado exalta o
valor da saúde física e mental, dedica esforços para prevenir e combater
doenças, por outro lado favorece a construção de uma sociedade adoecida.
A vida humana é ameaçada pelo desequilíbrio ecológico, poluição,
guerras e epidemias que atingem os mais vulneráveis. Há uma crescente promoção
de um estilo de vida, no qual a falta de sentido, de valores, o consumismo e
individualismo geram polarizações e frustrações que impedem as pessoas de
crescerem de forma saudável e fraterna.
Uma sociedade é saudável à medida em que favorece o
desenvolvimento saudável das pessoas. Quando, conduz ao seu esvaziamento
interior, fragmentação ou dissolução como seres humanos, devemos dizer que esta
sociedade é patogênica. Freud, em sua obra "O mal-estar na cultura",
considerou a possibilidade de uma sociedade como um todo estar doente e poder
sofrer de neuroses coletivas das quais talvez poucos indivíduos tenham
consciência.
Tal realidade me fez lembrar a obra do poeta português José
Saramago, "Ensaio Sobre a Cegueira", que retrata uma cidade cujos
habitantes ficam cegos e enclausurados e descobrem o quanto são egoístas. O
escritor é duro em seu romance ao fazer daqueles cegos a metáfora de uma
sociedade na qual cada um, nos momentos de perigo e angústia, pensa apenas em
si mesmo.
É aconselhável constantemente um exame de consciência, como nos
pedia Santo Inácio e se perguntar: O que é mais saudável, deixar-se levar por
uma vida de conforto, comodidade e excessos que sufoca o espírito ou viver de
forma sóbria e moderada, sem cair na "patologia da abundância"?
Continuar passando pela vida sem sentido, reduzindo-a a um "sistema de
desejos e satisfações", ou construir a existência dando-lhe sentido
último, a partir da fé? O que é mais saudável, reprimir a dimensão religiosa
esvaziando a nossa vida da transcendência ou viver a partir de uma atitude de
confiança naquele Deus "amigo da vida" que só quer e procura a
plenitude do ser humano? Carl G. Jung ousou considerar a neurose como "o
sofrimento da alma que não encontrou o seu significado".
Quem tem os olhos permeados pela fé, é capaz de ver luz onde
todos veem escuridão. Para aqueles que acreditam, há sinais de Deus em todas as
coisas.
(*) Sacerdote
jesuíta e mestre em Teologia. Escritor. Diretor do Mosteiro dos Jesuítas de
Baturité e do Polo Santo Inácio. Fundador do Movimento Amare.
Fonte: O Povo, de 1/06/2024.
Opinião. p.18.
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