Por Heitor Férrer (*)
Certa
vez, e já faz muito tempo, um professor nosso, médico, passava em frente
a uma enfermaria de um hospital e viu uma auxiliar de enfermagem passando uma
sonda naso-gástrica em um paciente que estava aos berros. Ele parou, entrou na
enfermaria e pediu para que aquela auxiliar de enfermagem, ao terminar o
procedimento, passasse uma sonda nele próprio. Dali em diante, ele disse que
nunca mais prescreveria uma sonda para alguém passar; ele mesmo passaria. Claro
que, de lá para cá, a evolução na formação de enfermeiros, atendentes e
auxiliares teve uma evolução extraordinária e hoje temos profissionais
altamente qualificados e confiáveis com formação invejável. Fiz essa
citação para podermos viajar até o mundo da pobreza, onde só sabe de sua
crueldade quem pertence a ele. Como diz o matuto, só quem calça é que sabe onde
o sapato aperta.
Esse
colega médico, para sentir o drama
do paciente, teve
que se tornar um deles e se submeter a um procedimento costumeiramente indicado
por ele, tendo tantas vezes banalizado a sua execução, sem nunca ter imaginado
o sofrimento dos pacientes. Como seria bom se todos nós pudéssemos adentrar a
uma enorme sala do Brasil, em uma realidade bem distante de nós, onde milhões
de brasileiros vivem com apenas um salário mínimo por mês: R$ 1.412,00!
Muitos
que estão lendo esse nosso artigo, talvez consumam esse valor em apenas um jantar
de final de semana. E não temos aqui a menor pretensão de criticar ou de
cercear o direito de consumo daqueles que produzem sua própria riqueza, mas
apenas abro uma janela para uma reflexão da perversa desigualdade que campeia o nosso país. Há
poucos dias, li uma reportagem com dados do IBGE, referentes até o ano de 2022,
trazendo que 60,1% dos brasileiros - 126 milhões de pessoas - vivem com até um
salário mínimo por mês.
Em
quatro estados - Maranhão, Alagoas, Paraíba e Amazonas - mais de 80% de sua
população tem renda de até, no máximo, um salário mínimo per capita; uma legião
de miséria e pobreza. E para tristeza e vergonha
nossa, está no nosso Nordeste o maior número desses pobres e miseráveis. A
continuar a perpetuação deste "status quo", não esperemos qualquer
saída desse poço profundo em que estamos melancolicamente mergulhados.
(*) Médico
e ex-Deputado estadual (Solidariedade).
Fonte: Publicado In: O Povo, de 3/05/2024. Opinião. p.19.
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