Por Carolina Matos (*)
Se alguém tem
dificuldade em perceber o lobby empresarial no Congresso Nacional,
observemos o que aconteceu na tramitação do projeto PL 914/2024. Trata-se do
Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que busca estimular a produção de
veículos com menor emissão de gases do efeito estufa e contará com crédito de
R$ 19,3 bilhões em cinco anos para as empresas poluírem menos.
Acredite se
quiser: foi nesse âmbito do Mover, ainda que a medida não tenha relação direta,
que o Senado aprovou a "taxa das blusinhas", que institui a taxação
de 20% em produtos com valor até US$ 50 comprados em plataformas estrangeiras
de comércio eletrônico. Somando-se aos 17% do ICMS, o novo imposto atinge em
cheio pessoas físicas e pequenos comerciantes. Nesse momento, nem o governo nem
Senado esperavam por essa.
O deputado Arthur
Lira (PP-AL) provou lealdade aos grandes varejistas, chegou com a proposta
debaixo do braço e foi incisivo para conseguir sua aprovação. As entidades
empresariais defendiam a volta do imposto para conquistar competitividade,
proteger a economia nacional, garantir empregos e ampliar estrutura produtiva.
É claro que a defesa continha uma dose de terrorismo econômico, ao indicar que
18 milhões de empregos estariam ameaçados sem o imposto.
O consequente
ganho para todo o país com o crescimento de compras de produtos nacionais cai
por terra porque o ganho não é geral e os produtos não são necessariamente
nacionais. As grandes lojas varejistas já importam em grande escala,
pagam menos impostos que pessoas físicas e vendem aqui com margem lucro
considerável. Logo, se lucram mais dessa forma, expandir a estrutura produtiva
nacional e aumentar a oferta de empregos passam longe da agenda empresarial.
Registre-se que, nos últimos anos, grandes empresas, independente de seus
lucros, movimentaram-se no sentido de ampliar terceirização, retirar direitos,
instituir várias funções em um só empregado e oferecer baixos salários.
A taxa da
blusinha é um reforço do sistema tributário regressivo no Brasil, que foca
sua arrecadação incidindo no consumo, o que afeta em maior proporção quem tem
menos renda. Ou seja, é uma medida extremamente impopular - e estamos em ano
eleitoral - mas o grande varejo tinha uma carta na manga: o presidente da
Câmara dos Deputados. É o poder econômico controlando o baralho do poder
político.
(*) Economista.
Fonte: O Povo, de 4/07/24. Opinião. p.19.
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