Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)
Acertadamente o
Presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a Lei Complementar n.º 208, de 2
de julho, que amplia a capacidade de investimentos do Estado ao autorizar a
securitização do fluxo de recebíveis da dívida ativa dos governos federal,
estadual e municipal. Os três entes da federação brasileira poderão ceder
onerosamente os direitos originados de créditos tributários e não tributários,
inclusive quando inscritos em dívida ativa às pessoas jurídicas de direito
privado ou a fundos de investimento, que são regulamentados pela Comissão de
Valores Mobiliários (CVM).
A aprovação
representa um marco histórico para as finanças públicas do país e abre a
oportunidade para recuperar receita, ampliar os investimentos públicos e
reduzir o inadimplemento de devedores com a União, os Estados e Municípios.
Afora isso e, em cumprimento à Lei de Responsabilidade Fiscal, a receita de
capital decorrente da venda de ativos, destinar-se-á, pelo menos, 50%
(cinquenta por cento) desse montante às despesas associadas a regime de
previdência social.
De uma maneira
geral, securitizar é um processo através do qual uma variedade de ativos
financeiros ou não-financeiros (ativos base) são vendidos, no mercado, a
investidores na forma de títulos. Desta forma, qualquer fluxo de caixa, seja
atual ou futuro, que é gerado por ativos, pode ser securitizado, como é
previsto na LC 208/2024. À medida que o mercado de securitização cresceu e se
tornou mais sofisticado, e a variedade de ativos securitizados também aumentou.
Assim, há uma necessidade dos governos também se modernizarem e incorporarem
outros mecanismos de receita para aumentar investimento público e dar
sustentação financeira e atuarial à previdência.
A securitização é
apenas um dos mecanismos existentes para transferir riscos a terceiros - o que
a literatura chama de finanças estruturadas, compreende os arranjos privados e
públicos para refinanciar atividades econômicas de forma não convencional, com
o intuito de reduzir custos de tomada de recursos e de intermediação de
instituições financeiras. Tivemos oportunidade de trabalhar no nascedouro desse
processo e, na época levantamos a recuperação destes valores, que não chegava a
0,7% dos estoques de dívida ativa, numa amostra de 10 estados brasileiros.
Os créditos da
Dívida Ativa são objeto de atualização monetária, juros e multas, previstos em
contratos ou em normativos legais, que são incorporados ao valor original
inscrito. A atualização monetária deve ser lançada de acordo com o índice ou
forma de cálculo pactuada ou legalmente incidente. O estoque administrado de
créditos tributários e de dívida ativa pela União, por exemplo, atingiu no ano
de 2021 R$ 5,51 trilhões. Desse total, apenas R$ 885 bilhões (16,06%) foram
reconhecidos no ativo, líquidos de ajustes para perdas, o que evidencia uma
expectativa de recuperação relativamente baixa, que pode ser significativamente
ampliada com a securitização da dívida ativa.
A política
pública para facilitar futuras securitizações lastreadas em fluxo deve se
concentrar na remoção de restrições. Os emissores podem reduzir os custos de
transação planejando uma série de emissões (um chamado acordo - o master
trust), o que permitiria economias de escala. O uso de agências de
classificação de crédito, para obter um selo de qualidade, também podem reduzir
os custos de transação. Agrupar recebíveis também é outra medida importante.
Portanto, cabe
também mencionar o papel decisivo do senador José Serra, que foi protagonista
desse projeto no Senador Federal, ao apresentar o PLS 204/2016. Agora cabem a
todos os entes da federação organizarem a gestão e a governança desse processo.
(*) Mestre em
Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e
Planejamento do Eusébio-Ceará.
Fonte:
O Povo,
de 8/08/24. Opinião. p.21.
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